Sempre quis poder voar – nisso sou igual a todos os homens. Foi então com esse intuito que um dia me aproximei da associação de estudantes da minha universidade. Como eu, assim fantasiando, por lá encontrei mais gente, e juntos lá nos fomos organizando e quotizando o suficiente para alcançarmos partilhar uma asa-delta em 3ª mão, razoavelmente remendada. Acabámos a lançar-nos pelas arribas abaixo de St.a Iria da Azóia nos fins-de-semana que se foram sucedendo. Éramos oito ao início, e era ver-nos pela madrugada, quais ícaros exaltados, a perseguir os ventos térmicos. Depois, um por um, alguns foram debandando com braços ao peito, narizes arrocheados e coragens esfareladas, até só restarmos três. Entretanto, vítima de maus-tratos e ousadias, a asa lá se ia partindo com abusada frequência, até um dia se tornar irreparável. Sem dinheiro, os voos voltaram a guardar-se na gaveta das quimeras e eu acabei por terminar os estudos sem nunca mais voltar a pensar nisso.
Hoje, olhando daqui do cimo da minha vida, vendo-lhe a planura por diante tão previsível e vazia de obstáculos, apeteceu-me experimentar voar de novo.