Era um homem sisudo, metido consigo mesmo e pouco dado a grandes estertores públicos. Apesar disso – e mesmo que nem fazendo ideia das suas poupadas mas ainda assim elogiadas capacidades na escrita – resolveu um dia, já para mais de 6 anos, criar um blogue.
Desde então escreveu e escrevinhou, coleccionou e arquivou, rebateu e contradisse uma imensidão de textos seus, para mais de dois milhares. E foi tal a genica dessas elucubrações que se esse aparo com que enchia o espaço virtual tivesse espessura de tinta caligráfica certamente lhe daria para atestar páginas suficientes de um livro, este de dimensão até bastante honrosa. Mas nunca o fez, nem pretendeu fazer, pois que esta, dizia e repetia, nunca fora a sua intenção. A razão de manter um blogue encontrava-se subjugada a um único intuito e todas as exaltações por onde a sua escrita passou, afinal, tão só pretendiam fazer cumprir o mesmo: que ela um dia o comentasse!
Passaram-se anos e os seus textos, ora mais empolgados ora mais desinteressados, conforme as marés da alma, continuaram a escrever-se quase sozinhos, escondendo sempre a secreta expectativa de que um dia, mesmo que remotamente, pudesse um vento do acaso trazer a uma das suas caixas de comentários uma, e ainda que breve, palavra dela. Contudo, nada, nunca. E os textos continuaram a escrever-se e o blogue, ainda que quase moribundo, continuou a desenrolar-se no éter da sua expectante idealidade e ele, já quase deslembrado do intuito inicial, continuou a cacarejar, ainda que cada vez mais sem nexo e espaçadamente.
Até que um dia, quase por mero acaso, acabou por esbarrar, finalmente, num comentário dela! Tudo assim se cumpriria, que consagração maior para a razão de tudo aquilo não haveria já de lhe calhar mais. Mas não, não quisera o destino premiar-lhe a diligência daquele propósito e ao invés, acabava assim por troçar dessa sua insolação da alma. Porque essas singelas palavras que tanto ansiara colher no seu blogue, afinal, foram por ele encontradas noutro, e por isso fazendo-se de outro o comentário que ela deixara. E nada mais lhe restou então, naquele dia – ainda que por defunção dos seus propósitos – que dar o blogue por cumprido e dele resguardar a sua chave.
19 de Janeiro, 2011 at 4:37 pm
Um simples motivo transportaria a desconsideração do significado deste belo préstimo, contudo afirmo-o: que vislumbre desconcertante.
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19 de Janeiro, 2011 at 6:23 pm
Quantas vezes não fazemos comentários ao que lemos, em conversas soltas, ao jantar, na sala à noite… são isso mesmo, comentários simples, descompremetidos, apenas opiniões.
Mas por vezes a escrita pesa, é dificil, não sei explicar…
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21 de Janeiro, 2011 at 1:46 pm
O acaso dorme, mas não dorme sempre. Quem sabe um dia acorda.
~CC~
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