Monthly Archives: Abril 2013

já vão 53 dias … e a contar

E quando acho que não dá para mais, faço uma viagem a 2006, onde assentava num outro diário um carpir mais desfraldado, mais lancinante e desavergonhado. E quem diria que as suas leituras ainda me iriam ser tão uteis. Pois se aquele desgraçado sobreviveu, este, que hoje se faz o mesmo, a pisar as mesmas veredas da vontade, também o conseguirá. Por ‘esta’ altura, gemia então assim:

Cada hora é mais uma braçada cansada, lançada a custo, e cada dia o princípio de um plano inclinado que tenho repetidamente de subir. Combato uma ansiedade que nunca julguei poder existir. É uma guerra sem inimigos e cujos golpes se desferem dentro de mim. Uma contenda que se trava num território que julgava conhecer e do qual tiraria vantagem, mas que afinal está armadilhado. Aos poucos fui me refugiando no meu corpo, do meu corpo. Combato já só na metade que ainda sobrevive, a parte do meu corpo que agora irei habitar, a que resta e à qual me agarro desesperadamente. Mas, de inconcebível, é o meu próprio corpo que(m) me quer abater. E não é um espectáculo bonito de se ver …


Bruxelas

Nunca gostei de Bruxelas. É uma cidade amuada, sem tempo para as pessoas, justamente porque as pessoas não têm tempo para ela. Ou nela transita gente imersa num tempo ocioso, a fazer horas para um destino seguinte, gente num intervalo de espera curto demais para se dispor a conhecer a cidade numa etapa de passagem, ou então somos abalroados por uma mole de pessoas cinzentas em passo de guerra, afogueada para chegar a algum local cronométrico, que fará de importante e urgente a etapa seguinte para a qual, nos seus ares engravatados, se acharão de novo ansiosos e atrasados. Bruxelas é uma cidade forrada de pessoas que ali passam em trânsito e de outros, seus habitantes, que vivem apressados demais poder compreender as suas pausas – é uma cidade desabitada. Até a chuva é assim, nem trovoada nem tempo que se deixe seco por mais de duas horas. De lá, no espólio fotográfico, trago sempre as mesmas imagens, a Grand Place, essa ilusão do que foi, quando ainda era cidade.

Fotografia tirada num inevitável dia de chuva em Bruxelas - 2013

Fotografia tirada num inevitável dia de chuva em Bruxelas – 2013