Monthly Archives: Janeiro 2009

vermisst

afonsotiagomissing1


apelo

Esta será provavelmente a única vez que lamentarei não ter um blog de grande audiência. Justamente agora que tanto gostaria que o mundo inteiro me pudesse ‘ouvir’ e que este sítio pudesse ter alguma utilidade. Hesitei em trazer para aqui a situação que anda a corroer toda a minha família. Não gosto da exposição pública, muito menos em assuntos desta natureza, mas perante a situação que vivemos é quase impossível lidar com a erosão com que este sentimento de impotência vai rasgando cada dia que passa, sem que tudo tentemos.

 

Vivo um momento de profunda angústia. O meu primo, recentemente licenciado em Engenharia Mecânica, foi convidado para estagiar numa empresa em Berlim, o que obviamente nem hesitou em aceitar. Estará por lá há poucos meses, nessa condição. No passado fim-de-semana regressava a casa com um amigo, depois de uma noite de folga e apesar de este lhe ter oferecido boleia ele preferiu ir pelos seus meios, presumo que a pé. Desde essa altura nunca mais ninguém soube dele. Desapareceu! Nem telefone, nem mails, ausência do trabalho, desconhecimento de todos os amigos, nada!

Já foi envolvida a polícia judiciária e a polícia de lá, assim como os serviços da embaixada. Até agora nada! Acredito que nestas situações, independentemente das iniciativas que os serviços competentes possam tomar, a difusão tão massificada quanto possível será o melhor instrumento ou pelo menos aquele que poderá levar a que mais olhos estejam atentos a qualquer indício. Desconheço qual o tipo de criminalidade de Berlim e se casos destes são assim tão frequentes. Tudo já me passou pela cabeça, como é óbvio, e até o facto de ele ter uma tez mediterrânica que poderá facilmente ser associada a um cidadão turco ou magrebino por exemplo, levanta-me interrogações sobre o nível de incidentes xenófobos que possam ocorrer por lá; também nisso estou desinformado.

Deixo aqui o meu apelo de contacto: se alguém achar que nos poderá ajudar a compreender e a perseguir alguma possibilidade, com o testemunho de incidentes equivalentes, por exemplo, ou que possam ajudar a compreender o contexto daquela cidade relativamente a situações que possam estar na origem deste desaparecimento, ou que tenha alguma informação que possa sugerir a divulgação deste desaparecimento junto de entidades ou sítios na internet, de natureza pública ou privada, que irradiem esta informação sobre a população alemã e particularmente alcancem a população berlinense, muito agradecia que me contactasse para o mail eufigenio@hotmail.com

Obrigado

 

elementos fisionómicos e outros dados aqui: http://findafonsotiago.blogspot.com/ 


fotosedativos

para ser franco terei de reconhecer que não fui feito …

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[ ‘buraco’ de vento ao largo da Sardenha ]

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[ ‘buraco’ de vento ao largo da Sardenha ]

delfins
[ companheiros de ‘infortúnio’ ]

dubrovnic-lisboa-2005
[ caipirinhas ao um chá … no deserto, claro ]

 extractos da reportagem Dubrovnic-Lisboa em 2005

… para suportar tanto frio!


das prendas de natal

pista

Intróito:

Desde que me lembro os desejos do Diogo quanto a prendas de Natal  sempre foram algo bizarros mas muito pormenorizados. Recordo-me que de entre estes já quis um peixe sem problemas, um gato, um cão, uma lebre e até um tigre para adoptar. Depois, com o crescer, a sua lista foi perdendo expectativas quanto à reprodução do mundo animal lá em casa e foi-se restringindo a desejos mais materiais que repete de ano para ano com ilimitada perseverança e que redundam num carro telecomandado, nuns jogos para a playstation e numa pista de carros. Este Natal a prenda mais ofuscante que o Diogo recebeu foi a pista de carros. Como referi, era anseio desde pequeno, mas era também um desejo traçado por alguma infelicidade. Na verdade esta já é a terceira pista que recebe. As duas versões anteriores morreram no próprio dia de natal ou pouco depois, estraçalhadas nas mãos impetuosas dos primos mais novos ou debaixo de algum sapato trapalhão de … cof cof … um pai. Até à data a qualidade do brinquedo também não ajudou pois que as versões anteriores eram mais próximas dos brinquedos de plástico indiferenciados do que desse universo entusiasmante (sei-o agora, por razões que já adiantarei) das esmeradas e orgulhosas pistas de corrida à moda antiga. O infeliz rapaz nesta matéria acabou por ser duplamente vitimado já que não só foi perdendo os seus nados-mortos presentes favoritos como foi ouvindo ao longo dos anos o recalcitrado argumento de “mais uma, para acontecer o mesmo que às outras!?”

Mas este ano, alterado o sistema contributivo dos presentes na família, coube aos pais aplicar em prendas o ‘plafond’ recolhido da contribuição dos outros familiares, o que permitiu alvejar presentes mais interessantes que de outra forma seriam inalcançáveis com orçamentos retalhados. Posto isto, achámos que seria uma boa oportunidade para mais uma vez tentar cumprir-lhe a fantasia das pistas de carrinhos eléctricos (no tempo da playstation, um jogo que não seja mero cenário virtual, na cabeça de um miúdo, começa de facto a ser uma aspiração de encorajar). Desta vez, bem aconselhado, fui ao “corte inglês”. Lá chegado, fiz como costumo quando preciso decidir algo para comprar sobre o qual pouco ou nada conheço: deixei-me ficar por ali, olhando, comparando, cirandando, habitando aquele espaço com ar atrapalhado à espera da inevitável intercepção que nestas condições acabará sempre por acontecer. Saiu-me um vendedor de uns 40 anos com um brilhozinho nos olhos que não enganava – era este mesmo quem eu procurava, uma criança disfarçada que tinha escolhido como profissão vender o seu brinquedo preferido de sempre. Fui ouvindo das suas razões apaixonadas que a melhor já nem era a SCX, mais cara, mas a Ninco, da qual há anos ele era devoto adepto. Estávamos os dois neste plano de considerações e nisto junta-se a nós outra criança, espontaneamente, como só as crianças sabem fazer quando o assunto que rola é diversão. Teria também ele perto da nossa idade, a barba por fazer, com tiques de executivo mas vestido com ganga de fim-de-semana. Nova cara, novas sentenças. E que o desculpassem mas que vinha discordar, que a SCX até já era digitalizada (fica já agora a saber o estimado leitor que a digitalização destas pistas não tem a ver com nenhum processo alquimista de as desmaterializar em corridas de computador, mas tão simplesmente na capacidade de controlar em apenas duas vias um número quase ilimitado de carros) e que … mas que não – interrompia logo o outro – que a NINCO também já tinha um kit para ser digitalizada e que no fim sairia mais barato até. Desta fervorosa discussão fui bebendo tudo e quando saí com um enorme embrulho debaixo do braço tinha a consciência de que não só levaria a prenda acertada como me tinha tornado um quase especialista da coisa.

Quando o Diogo a recebeu não só foi presenteado com o brinquedo desejado como ainda teve direito a um rol de explicações catedráticas sobre o mister do hobby (pois, que agora já eu, erudito no assunto, o considerava mais que brinquedo), das quais importaria reter que aquela pista era apenas o início de um investimento que, assim ele quisesse e pudesse, se poderia ir cumprindo cada vez com mais lanços de estrada e gingajogas até infestar o chão de toda a casa num enorme emaranhado de rectas, curvas, pontes e cruzamentos de via e … enquanto isto, os nossos olhos brilhavam, e certamente os dos dois ‘miúdos’ que lá na loja havia deixado. Face a isto, ainda nem a tinha montada e já tinha compreendido que a pista que lhe era oferecida era apenas a primeira etapa de uma construção babilónica que, a ser pretendida, teria de ser resgatada de várias prendas futuras. E logo a pensar nisso, que o dia de anos anda por aí já tão perto.

 

(…)

Manhã do dia 26 de Dezembro, hora do acordar, tardia já. A persiana levantada para um dia frio mas ensolarado. Eles ainda estremunhados, encaracolando-se no calor dos lençóis. Eu, junto à janela, rabiscando no computador deles onde mais tarde guardarei estas notas. Seguindo uma estratégia ensaiada há largos anos mantenho com os dois um diálogo solto, o qual vou pigmentando de perguntas como forma de os obrigar a reagir e assim se trazerem, ainda que arrastadamente, para o mundo dos acordados. Passo a reproduzir a troca de palavras com o Diogo, o da cama de cima do beliche.

– Já estás acordado Diogo? Vamos, são horas.

– Mais ou menos pai. Estou a sonhar.

– Ah. Estás naquela fase boa em que já conseguimos ir participando no nosso sonho? É como se pudéssemos ir inventando uma história escrita por nós mas sem sabermos o que se irá passar, não é!?

E os dois concordando, ainda que de forma ininteligível de ruídos ensonados, seguramente a experimentar nesse momento o sono morno de que lhes falava.

– É a altura em que todos somos heróis não é? – adianta o Francisco já mais composto. Risada geral.

– Diogo, e pode-se saber que super-herói estás a ser no teu sonho? – Já mais que estratégia, trazendo também curiosidade, esta minha pergunta.

– Oh pai, eu ainda não acordei bem …

– Eu sei, por isso é que quero saber. Se já estivesses acordado o sonho já teria desaparecido.

– Mas eu não estou a ter nenhum sonho de herói. Deixe-me ficar na cama mais um pouco, vá lá!…

– Não estás?! Mas então o que sonhas tu? O que pode ser melhor que sermos o super-herói dos nossos sonhos?

E ele, ainda de voz entaramelada mas já acicatada por alguma irritação, algo desgastado até de ver o sonho esvair numa consciência que eu irritantemente acordava, lá nos foi revelando:

– Estou a sonhar que … estou no “Corte Inglês”. A comprar bocados de pista.

 

Registe-se para memória futura, na ressaca do Natal de 2008.