A minha primeira paixão foi uma vizinha que já tinha maminhas. Teria mais uns dois anos que eu. Tímido, rondava as brincadeiras onde ela entrava até que um mero acaso ou alguém me chamasse a participar. Às vezes aguardava por ali a tarde inteira, ia, vinha, sentava-me, levantava-me, até finalmente recolher a casa ao fim do dia, frustrado, carregando comigo mais um insucedido encontro. No dia seguinte a mesma coisa. E todos os dias a intransponível distância da minha timidez a deixava lá longe, numa fortaleza platónica que se ia tornando cada vez mais inexpugnável. Treinei-me então em sonhá-la e ela tornou-se sem o saber o meu avatar do desejo. Sem que eu desse por isso, a encantadora rapariga foi sendo revezada pela personagem que dela ia esculpindo nas minhas fantasias. Por fim, a miúda por quem me apaixonei passou a desinteressar-me completamente e a carne que desejei esvaiu-se nas nuvens de ilusão com que modelava as minhas ficções.
Não se devem matar os desejos com sonhos, nem os sonhos devem ser desfigurados com fantasmagorias da realidade que não ousamos alcançar. Os sonhos assim fabricados acabarão por inibir a nossa maravilhosa capacidade de desejar e a imitação do real, no nosso território onírico, assim avassalado, levará a que este deixe de poder ser o refúgio para as nossas hesitações interrogações.
Mas isso ainda poderei vir a aprender um dia.
15 de Maio, 2009 at 1:26 pm
oh, rapaz sábio, voto difícil.
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15 de Maio, 2009 at 2:34 pm
Uma musa inspiradora, portanto :)
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15 de Maio, 2009 at 8:01 pm
Pois fica sabendo….que gostei muito deste “textito de amor” e deixou-me cá a falar com os meus botões: interrogações/hesitações.
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15 de Maio, 2009 at 8:27 pm
não vejo sageza aqui Claudia, nenhuma, mas um voto talvez, talvez um voto de castidade
enfim TalvezteEscreva, inspirou-me tanto que se autosubstituiu
Andreia, achas mesmo que é um texto de amor?! desamor, não?
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15 de Maio, 2009 at 11:02 pm
«Mas isso ainda poderei vir a aprender um dia.» Então, aprenderás para pior.
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16 de Maio, 2009 at 4:46 pm
efe, os sonhos são um paliativo dos desejos. e isso não é bom, na minha opinião.
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16 de Maio, 2009 at 1:56 am
Este texto leva-me ao anterior “das causas causadas e dos causídicos”.
As paixões são efémeras e carregadas de incoerências que a vida se encarrega de nos mostrar, desde tenra idade. Apesar de alguns passarem ao lado …
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16 de Maio, 2009 at 4:47 pm
Bros, não sei se alcanço completamente o sentido das tuas palavras. E nisso quero crer que “estou a passar ao lado” …
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16 de Maio, 2009 at 6:54 pm
Não te preocupes, não era para ti e porventura escrito no local errado.
Um mero desabafo a que me levaram os teus textos. Ressaca?!?!?!
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16 de Maio, 2009 at 8:37 pm
nunca aqui escreverás no local errado Bros
…pois
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